Dantas possui dificuldades na locomoção, na fala e não possui coordenação motora para escrever. Ainda assim, conseguiu construir uma trajetória proeminente na área do Direito, sobretudo no Direito Constitucional e Processual Civil. Pesquisador na área de Direitos Humanos com ênfase em inclusão da pessoa com deficiência, políticas públicas e educação para direitos humanos, no Doutorado, Lucas pesquisa a Responsabilidade do Estado, sob orientação do professor-doutor Renato Bernardi.
Em Marília, Lucas é o responsável técnico pelo escritório de advocacia Dantas e Santana, onde trabalha junto a duas sócias, a irmã Andrea Ricci Dantas Yanaguizawa e a noiva Jenifer Santana. É o único escritório do país com um núcleo especializado no atendimento à pessoa com deficiência.
Quinzenalmente, ele vem a Jacarezinho para participar das aulas do Doutorado. O pai, que o traz para a cidade, é um dos maiores aliados do filho para superar as dificuldades impostas pela paralisia cerebral. Por vezes, digita documentos ou escreve para Dantas, que dita as informações.
“As minhas mãos não acompanham o meu cérebro. Mas eu leio muito, estudo muito, trabalho muito, faço anotações à minha maneira e consigo digitar, mas não tão rápido. Meu pai me ajuda sempre que possível”, relata.
O doutorando destaca a boa acolhida que teve na UENP ao iniciar o Programa. “Eu fiquei surpreso positivamente com a receptividade de toda a comunidade acadêmica da Universidade. Professores, colegas e servidores. É realmente um ambiente de afeição, que sempre toma como pressuposto os princípios acadêmicos valorizados nas instituições públicas”, destaca.
Desafios superados
Apesar de possuir uma série de limitações físicas relacionadas à paralisia cerebral, Lucas é contra rótulos que possam diferenciá-lo por sua condição. “Eu não sou um prodígio. Sou apenas uma pessoa esforçada. Na verdade, tenho capacidade para ser ainda mais, e às vezes me sinto até meio preguiçoso”, brinca.
“O ingresso de Lucas no Doutorado nos tem feito pensar em políticas de acesso e permanência à pessoa com deficiência no ensino superior, especialmente no nosso Programa de pós-graduação”, destaca o coordenador do Programa, professor-doutor Fernando Brito.
Atualmente, a UENP tem cerca de 30 acadêmicos com algum tipo de deficiência física, visual ou auditiva. O processo seletivo vestibular oferece condições especiais para pessoas com deficiência, tendo acréscimo de uma hora no tempo de prova e demais alterações nas condições de realização do exame, conforme a necessidade de cada candidato, avaliada por uma banca específica.
Trajetória e visões
Lucas fez os primeiros anos de seu ensino fundamental em uma classe especial. Depois, integrou as turmas regulares. Durante o ensino médio, diz ter cogitado seguir para a área da Publicidade, mas acabou parando no Direito. “Não tinha muita clareza do que iria fazer. Mas no primeiro mês da faculdade, tive certeza de que realmente o Direito era o que eu queria para a minha vida”, conta.
“Não muito depois eu também decidi que queria ser professor. Por isso acabei seguindo o caminho da vida acadêmica e hoje faço doutorado na UENP. Quero lecionar e produzir. No próximo semestre já farei estágio em docência junto aos alunos do curso”, relata o acadêmico.
Lucas não teme o preconceito, embora reconheça que ele exista. “Eu já sofri muito com preconceito. Hoje, não mais. As pessoas me respeitam e reconhecem o meu trabalho. Mas é preciso educar para prevenir também o preconceito à pessoa com deficiência”, afirma.
A leitura de Dantas sobre o cenário atual da educação e da inclusão da pessoa com deficiência na Academia aponta para um contexto ainda longe do satisfatório. “Os alunos, de forma geral, são pouco incentivados a chegar até a pós-graduação. Se não é comum para os indivíduos sem deficiência ingressar em mestrados e doutorados, imagina para uma pessoa deficiente”, compara.
“Falta investimento para atrair e manter a pessoa com deficiência estudando. A maior parte dos deficientes vem de classes mais baixas, pois muitas das deficiências são causadas por problemas na gravidez que seriam evitados se houvesse o acompanhamento médico adequado. Mas, para uma pessoa em estado de vulnerabilidade, esse cuidado nem sempre é possível. São necessárias mais políticas públicas de inclusão ao deficiente em todos os níveis educacionais, do infantil à pós-graduação”, defende.